Pular para o conteúdo

OURO DE TOLO

Quando eu tinha cerca de 8 ou 9 anos, ainda não tínhamos televisão em casa e o cinema era a diversão máxima da garotada. Mal podíamos esperar o domingo chegar para ir às matinês à tarde assistir aqueles incríveis filmes de cawboy. Mas não era sempre que podíamos ir, por falta de recursos financeiros.

Éramos em 6 irmãos, mas minha avó materna tinha um xodó comigo que fazia eu me sentir bem. Sempre que vinha de São Paulo capital nos visitar em São Vicente, ela trazia um pó de morango para adoçar o leite.

Numa destas suas vindas à nossa casa, tentei manipulá-la para me levar à matinê, mas ela também não tinha dinheiro.

Eu estava muito ansioso para ir ao cinema. À noite, quando meu pai voltou do trabalho, pedi a ele que me desse dinheiro, pois eu queria levar a vovó no cinema (kkk).

O meu pai era um bom sujeito, apesar das dificuldades para manter uma família tão grande, ele era bem humorado.

Bem, nessa noite ele disse: — É dinheiro que você quer?

Colocou, então, pilhas de dinheiro na mesa da cozinha e disse: — Pegue… é todo seu.

Meu coração quase saiu pela boca. Eu já me via na matinê com a minha avó.

Então meu pai começou a rir e disse algo mais ou menos assim: — Esse dinheiro não vale mais nada!

— Como assim? Eu pensei!

“Simples”, o Cruzeiro havia mudado para Cruzeiro Novo, na proporção de mil por um.

⇒ ⇒ ⇒ 

Não fiquei magoado com o meu pai, mas, confesso que fiquei confuso e muito decepcionado, afinal, o que uma criança consegue compreender destas manobras monetárias? Como podia tanto dinheiro não valer nada? Aquelas pilhas de notas não podiam pagar nenhum ingresso ao cinema, nem o meu, nem o da vovó.

Até hoje gostaria de tê-la levado ao cinema. Cerca de 9 ou 10 meses depois ela voltou para nos visitar e faleceu, dormindo em minha cama, ao meu lado. Ela nunca tinha ido ao cinema. E eu, claro, daria um braço para ir.

“Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam.” (Mateus 6:19,20)

 

Título: Ouro de tolo
Autor: Pr Ronaldo Franco
Data: 05/02/2023

Deixe seu comentário logo abaixo.

Veja também nossos demais esboços: Esboços

Ouro de tolo

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.